❌ “Captação” de patrocínio está ultrapassada. A palavra certa é.. VENDA.
- Redação - Patrocinio Brasil
- há 2 horas
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Durante anos, falamos em “captação de patrocínio” como se estivéssemos buscando apoio ou doações de empresas que já tinham recursos reservados e estavam apenas escolhendo para onde mandar. Mas o mercado evoluiu — e esse termo se tornou não apenas equivocado, como limitante.
Patrocínio não se capta, ele se vende.
E há uma explicação histórica para essa confusão: no Brasil, a palavra “captação” se popularizou por influência da área de captação de recursos, uma atividade essencial, especialmente no terceiro setor, voltada à busca de doações, incentivos fiscais e apoio filantrópico. No entanto, captação de recursos e venda de patrocínio são processos diferentes.
Patrocínio é uma troca comercial estratégica entre marcas e projetos. Envolve objetivos de marketing, branding, reputação, ativação e resultado. É planejamento, é negociação e — principalmente — é venda.
Aliás, em mercados maduros como Estados Unidos, Canadá ou Reino Unido, o termo “captation” nem existe no contexto de sponsorships. Lá, o profissional é chamado de Sponsorship Manager ou Partnership Executive. Ele atua dentro das áreas de marketing, comercial, comunicação ou ESG. Não está pedindo, está propondo soluções.
Por isso, insistir no uso da palavra "captação" para tratar de patrocínios comerciais é perpetuar uma visão ultrapassada. Quem ainda pensa em captar, está ficando para trás.
Patrocínio é estratégia , e estratégia exige método
Empresas patrocinam com objetivos muito claros: construir reputação, engajar públicos, gerar conteúdo relevante, ativar territórios estratégicos, posicionar valores institucionais e se comunicar com diferentes segmentos da sociedade. O patrocínio faz parte dos planos de marketing, branding, ESG e até de RH das empresas. Isso significa que ele não é algo “extra” — é uma ferramenta de negócios integrada ao planejamento da marca.
Por isso, vender patrocínio exige um profissional com pensamento estratégico, capacidade analítica e uma formação multidisciplinar. Não basta conhecer o projeto que está oferecendo. É preciso compreender a fundo como funcionam os processos de decisão dentro das empresas, como se estruturam os planos de marketing e comunicação, quais são as diretrizes ESG, e quais indicadores são valorizados por cada marca.
A venda consultiva começa com escuta
Todo bom processo de venda consultiva começa com uma escuta genuína. Em vez de começar a reunião falando do projeto, o profissional que trabalha com patrocínio deve começar fazendo boas perguntas. É fundamental entender quais são os desafios da empresa naquele momento: se ela está buscando mais visibilidade institucional, se quer se posicionar em determinado território, se está criando uma nova campanha de reputação, ou se quer ampliar o engajamento com um público específico.
Essa escuta ativa permite alinhar o projeto às reais prioridades da marca. Por exemplo, uma empresa que quer melhorar sua reputação ambiental pode ter muito mais interesse em apoiar um projeto de reflorestamento urbano do que um festival cultural, ainda que ambos estejam dentro da lei de incentivo. A escuta transforma uma proposta genérica em uma solução sob medida.
Prospecção é relacionamento, não disparo
A prospecção também precisa mudar. Em vez de enviar o mesmo PDF para dezenas de marcas com a esperança de alguma resposta, é necessário fazer um mapeamento detalhado de onde cada empresa atua, quais valores comunica, que tipos de projetos já patrocinou e em que setores tem presença. Essa análise permite abordagens personalizadas, com maior taxa de resposta.
Por exemplo, se uma empresa de tecnologia está expandindo sua atuação no setor educacional, um projeto cultural com impacto em escolas públicas pode fazer mais sentido do que um evento esportivo. Ao mostrar que você conhece o momento da empresa, o território em que ela atua e o que ela busca, sua abordagem deixa de ser um pedido e passa a ser uma proposta de valor.
A proposta precisa resolver um problema
Uma boa proposta de patrocínio é uma resposta objetiva a uma necessidade real da marca. Em vez de se concentrar apenas em descrever o projeto, a proposta precisa deixar claro o que será entregue à empresa, quais públicos serão atingidos, como isso se conecta à estratégia da marca e quais resultados poderão ser medidos.
Por exemplo, um festival de música patrocinado por uma marca de bebidas pode não se limitar a exposição de logo. A proposta pode incluir criação de conteúdo exclusivo, engajamento nas redes sociais da marca, ações promocionais no ponto de venda e relatórios mensais de performance com métricas combinadas. Essa é uma proposta de patrocínio que resolve uma série de demandas de marketing — e, por isso, tem muito mais chance de ser aprovada.
Apresentação é impacto, não só estética
Ao apresentar um projeto, o tempo é curto e o impacto precisa ser imediato. O ideal é começar com um dado de mercado, uma provocação ou uma conexão com a marca. Depois, construir a narrativa com lógica: o problema que o projeto resolve, a solução que ele representa, o diferencial que oferece e os resultados que pode entregar.
Uma boa apresentação não é uma sequência de slides, mas um roteiro pensado para gerar convencimento. Visualmente atrativa, concisa, com dados relevantes, vídeos curtos, imagens fortes e linguagem clara. Quem apresenta bem, vende com mais chances.
Negociação é construção de valor
Negociar não é baixar o preço. É construir um acordo que gere valor percebido para ambos os lados. Isso significa estar aberto a ajustar entregas, ampliar ou reduzir escopo, trocar visibilidade por conteúdo ou serviços, e até incorporar contrapartidas não financeiras, como apoio de mídia, produção de vídeos ou espaços institucionais.
Por exemplo, em um projeto social com foco em jovens empreendedores, uma empresa pode aceitar menos exposição de marca em troca de dados de impacto, histórias para campanha de ESG ou presença institucional em uma cerimônia de formatura. O que importa é que a negociação respeite o valor do projeto e amplie os ganhos da marca, sem comprometer sua integridade.
Pós-venda é onde nasce a renovação
Muitos patrocinadores não renovam porque, depois do contrato assinado, nunca mais ouviram falar do projeto até receberem um relatório apressado no fim do ano. Isso é um erro grave. O pós-venda deve ser ativo, próximo e contínuo.
Envolver o patrocinador em momentos-chave do projeto, enviar relatórios parciais com fotos e resultados, convidar representantes da marca para visitar ativações ou eventos, promover reuniões de avaliação e, principalmente, mostrar que a parceria está viva. A confiança se constrói na entrega — e a renovação nasce da confiança.
A força estratégica de cada tipo de patrocínio
O patrocínio esportivo, por exemplo, é uma das formas mais eficazes de conectar marcas a comunidades de alto engajamento emocional. Um clube de futebol regional, uma equipe olímpica ou uma corrida de rua são oportunidades de ativação de marca com grande poder de presença, mídia espontânea e relacionamento local. Um bom projeto esportivo oferece dados sobre audiência, torcida, impacto digital e presença nos territórios onde a marca atua.
Já o patrocínio cultural oferece conteúdo, identidade e valor simbólico. Projetos culturais fortalecem a imagem institucional da marca, geram conteúdo relevante para campanhas e posicionam a empresa como promotora da diversidade e da arte. Isso é ainda mais forte quando o projeto dialoga com os valores da marca e suas estratégias de comunicação. A lei de incentivo pode ser uma ferramenta, mas o patrocínio vai muito além do benefício fiscal.
No campo social, o foco está no impacto. Marcas que investem em projetos sociais buscam reputação, narrativa institucional e alinhamento com suas diretrizes ESG. O diferencial aqui está na capacidade de apresentar dados reais de transformação, relatórios de impacto, histórias que humanizam a ação e conexão com os objetivos de sustentabilidade da empresa.
Por fim, no patrocínio corporativo ou B2B, o valor está no acesso. Empresas patrocinam eventos, fóruns e projetos institucionais com o objetivo de se posicionar, gerar negócios e fortalecer relacionamento com stakeholders estratégicos. Aqui, é fundamental oferecer experiências qualificadas, conteúdo relevante, visibilidade institucional e espaços de networking com público de alto poder decisório.
O novo perfil do profissional de patrocínio
Hoje, vender patrocínio exige mais do que conhecer o projeto que se representa. Exige entender profundamente o contexto da marca, suas metas e seus desafios. O profissional de patrocínio precisa dominar conceitos de vendas, de marketing estratégico, de comunicação institucional, de branding, de reputação, de gestão de indicadores, de ESG e até de políticas públicas.
É alguém capaz de transitar entre áreas diversas dentro da empresa patrocinadora — da área de comunicação ao financeiro, do jurídico ao ESG, do RH ao comercial — e ainda assim ser percebido como um interlocutor seguro, profissional e estratégico.
Patrocínio é uma das ferramentas mais completas de relacionamento de marca com a sociedade. Exige preparo, técnica e visão de longo prazo. E quem quiser crescer nesse mercado precisa abandonar o discurso da “captação” e abraçar de vez o pensamento de venda consultiva com propósito e resultado.
Vivemos hoje na era do conteúdo
Muitas vezes o volume e a frequência de publicações parecem valer mais do que profundidade, experiência ou consistência estratégica. O mercado de patrocínios, infelizmente, não está imune a isso. Nos últimos anos, vimos crescer o número de cursos, eventos, perfis e promessas no estilo das redes sociais “arraste pra cima”, "clique aqui" propondo soluções rápidas e fórmulas mágicas para "captar" patrocínio. O problema é que muitos desses conteúdos são produzidos por quem nunca participou de uma negociação real, nunca vendeu um projeto de verdade ou nunca precisou entregar resultado a uma grande marca. É conteúdo teórico e com pouca base prática, sem dados reais, sem exemplos concretos e, muitas vezes, sem qualquer compromisso com a realidade do mercado.
O patrocínio exige muito mais do que teoria. Exige experiência de campo, escuta, negociação, entrega. E exige, acima de tudo, responsabilidade com o setor. Reforçar ilusões ou simplificar um processo complexo só contribui para a desvalorização do profissional sério e do projeto bem estruturado.
Por isso, mais do que falar de patrocínio, é preciso viver o patrocínio — em sua complexidade, nas suas nuances e no seu verdadeiro potencial estratégico para marcas e para a sociedade.
Adauto Gudin
Profissional com mais de 28 anos de atuação no mercado de patrocínios, com experiência direta em planejamento estratégico, vendas consultivas e gestão de projetos patrocinados desde 1996. Atuou em vendas e marketing de patrocínios com marcas e instituições líderes, como NCR, Oracle, IBM, Google, Novartis, Natura, Computer Associates, Itaú, Bradesco, Banco do Brasil,ONU, ABB, CEF, Microsoft, Petrobrás, DHL, Duke Energy, Copel em eventos corporativos, esportivos, festivais culturais, organizações sociais e eventos , sempre com foco em conectar marcas e projetos por meio de soluções com propósito, impacto e retorno estratégico.
Fundador e presidente da APBR – Associação Patrocínio Brasil, organização nacional criada com a missão de fortalecer o ecossistema de patrocínios no país. A partir de uma visão institucional do setor, Adauto lidera hoje iniciativas voltadas à profissionalização, boas práticas, geração de conteúdo, formação de lideranças e promoção de um mercado mais ético, eficiente e sustentável. É também idealizador do Sponsors Brasil, o maior circuito de encontros e eventos sobre patrocínios do país, e responsável por cursos e programas de capacitação focados em marketing, vendas e mensuração de resultados no patrocínio cultural, esportivo, social e corporativo.